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sábado, 24 de março de 2018

Padre acusado de desviar dízimo é flagrado pelo MP em ligação confirmando a compra de carros: 'Pagou direitinho?'



Ministério Público de Goiás (MP-GO) interceptou uma ligação do padre Moacyr Santana, pároco da Catedral Nossa Senhora Imaculada Conceição, em Formosa, para o empresário Antônio Rubens confirmando se a compra de carros havia dado certo. Além dos dois, mais quatro padres, o bispo Dom José Ronaldo e um empresário estão presos suspeitos de participar do esquema que pode ter desviado R$ 2 milhões de dízimos e doações.
“Ainda bem que os carro pagou direitinho, né Rubinho? (sic)”, questiona o padre na ligação. Em seguida, o empresário concorda.
As escutas telefônicas autorizadas pela Justiça ainda apontam que o grupo comprou uma fazenda de criação de gado e uma casa lotéricacom dinheiro desviado de dízimos e doações. Na decisão que determinou as prisões temporárias, o juiz disse haver indícios de que o dinheiro era usado para despesas pessoais e que carros da Diocese de Formosa eram usados com fins particulares.
O grupo está no presídio de Formosa desde segunda-feira (19), após o Ministério Público deflagrar a Operação Caifás. Na sexta-feira (24), o juiz Fernando Oliveira Samuel acolheu a denúncia dos promotores e decidiu manter presos o bispo de Formosa, Dom José Ronaldo, o vigário-geral e segundo na hierarquia de Formosa, monsenhor Epitácio Cardozo Pereira; o juiz eclesiástico Tiago Wenceslau; os padres Moacyr Santana, Mário Vieira de Brito, Waldoson José de Melo; e os empresários e supostos laranjas, Antônio Rubens Ferreira e Pedro Henrique Costa Augusto
O MP-GO não denunciou o secretário da Cúria, Guilherme Frederico Magalhães, que havia sido detido no dia da operação. O G1 tentou contato por telefone com o promotor responsável pelo caso, Douglas Chegury, mas não recebeu retorno até a publicação desta reportagem. O juiz determinou que Guilherme seja liberado do presídio. A reportagem também não localizou a defesa dos demais presos para comentar o caso.
De acordo com a Nunciatura Apostólica, que atua como embaixada da Santa Sé, o Papa Francisco havia determinado que as contas da Diocese de Formosa fossem investigadas no início do mês, antes mesmo das prisões. O arcebispo de Uberaba (MG), Dom Paulo Mendes Peixoto, foi nomeado administrador apostólico, espécie de "interventor".
“No dia que Dom Paulo estava indo até a Formosa fazer essa visita [ordenada pelo Papa], o Bispo, Dom José Ronaldo Ribeiro, foi preso. E preso também os demais religiosos. Logo não fazia sentido Dom Paulo ir até Formosa para esta visita, uma vez que a Diocese estava sem representante, ele não teria com quem conversar”, explicou a assessoria do “interventor”.
Dom Paulo Mendes Peixoto auxiliará nas atividades da diocese de Formosa até que novo bispo seja nomeado (Foto: CNBB/ Divulgação)Dom Paulo Mendes Peixoto auxiliará nas atividades da diocese de Formosa até que novo bispo seja nomeado (Foto: CNBB/ Divulgação)
Dom Paulo Mendes Peixoto auxiliará nas atividades da diocese de Formosa até que novo bispo seja nomeado (Foto: CNBB/ Divulgação)
Em entrevista à TV Anhanguera, Dom Paulo afirmou que estará à disposição da comunidade e dos religiosos detidos. Ele volta para Uberaba (MG) no sábado, onde fica por tempo indeterminado, já que segue administrador lá também.
“A primeira atitude minha é conversar com os padres, dizer que a gente está com o coração aberto para ajudá-los e contar com a ajuda deles", afirmou.
"A questão que aconteceu, a Justiça é que tem que dar a sua palavra. A gente não [pode] ficar preocupado com isso não,[vamos ficar] preocupados com o povo que precisa de uma segurança, os padres, que também precisam de uma segurança. Vou estar ali com eles, [serei] mais um para somar”, afirmou.
Ministério Público de Goiás cumpre mandados na Igreja Católica em Formosa, Planaltina e Posse (Foto: MP-GO/Divulgação)Ministério Público de Goiás cumpre mandados na Igreja Católica em Formosa, Planaltina e Posse (Foto: MP-GO/Divulgação)
Ministério Público de Goiás cumpre mandados na Igreja Católica em Formosa, Planaltina e Posse (Foto: MP-GO/Divulgação)

Investigações

As investigações começaram no ano passado, após denúncias de fiéis. Eles afirmaram que as despesas da casa episcopal subiram de R$ 5 mil para R$ 35 mil desde a chegada do bispo Dom José Ronaldo. Na ocasião, o clérigo negou haver irregularidades nas contas da Diocese de Formosa.
Segundo a investigação, o grupo se apropriava de dinheiro oriundo de dízimos, doações, arrecadações de festas realizadas por fiéis e taxas de eventos como batismos e casamentos. O bispo Dom José Ronaldo sempre negou as acusações.
Os presos estão em celas isoladas no presídio de Formosa, com direito a até duas horas por dia de banho de sol e chuveiro sem eletricidade.

Depoimentos dos padres

Nesta quinta-feira (22), os promotores encerram a fase de oitivas. Eles colheram os depoimentos do bispo, do monsenhor e juiz eclesiástico. O órgão disse que, por enquanto, não vai divulgar o teor dos relatos por pedido da defesa dos detidos.
Anteriormente, outros padres tinham dito que eram coagidos pelo bispo a compactuar com as irregularidades. O promotor Douglas Chegury já havia dito que os depoimentos eram "contraditórios" e cheios de justificativas "absurdas".

‘Juramento de fidelidade’

Convocado após denúncias de desvios de dízimos e doações na Diocese de Formosa, o juiz eclesiástico Tiago Wenceslau forjou um relatório das contas questionadas anunciando que “auditoria rigorosa” apontou não haver nenhuma irregularidade, de acordo com o MP-GO.
“[O juiz eclesiástico] Veio [de São Paulo] com um objetivo: intimidar de forma definitiva os padres e fazer com que eles fizessem, como de fato muitos fizessem, um juramento de fidelidade ao bispo [Dom José Ronaldo, apontado como líder do esquema]”, explicou o promotor Douglas Chegury.
“Chamados nominalmente, [os padres] deveriam responder se estavam com o bispo ou contra o bispo, não era com a igreja ou contra igreja. Isso aconteceu em uma reunião a portas fechadas”, completou.
Fachada da Cúria Diocesana de Formosa, em Goiás (Foto: TV Anhanguera/Reprodução)Fachada da Cúria Diocesana de Formosa, em Goiás (Foto: TV Anhanguera/Reprodução)
Fachada da Cúria Diocesana de Formosa, em Goiás (Foto: TV Anhanguera/Reprodução)
De acordo com o MP-GO, havia “clima de terror e opressão” e ameaças de retaliação, transferências e até perda de ministério aos clérigos que não se calassem ou não demonstrassem apoio ao bispo.

'Mesada' por paróquias mais rentáveis

A investigação aponta ainda que padres de Formosa, Posse e Planaltina pagavam ao bispo de Formosa, Dom José Ronaldo, para que fossem mantidos em paróquias mais lucrativas. O valor mensal da "mesada" variava entre R$ 7 mil e R$ 10 mil.
"As informações que nós obtivemos é que, para permanecer nas paróquias que davam mais dinheiro, os padres pagavam uma mesada, em dinheiro, ao bispo. Um pároco, que contribuiu com as investigações, inclusive, chegou a ver esse repasse", disse o promotor Douglas Chegyry ao G1.

Dinheiro escondido em guarda-roupa

Foram apreendidos cordões de ouro, relógios e caminhonetes da cúria em nomes de terceiros, além de uma grande quantia de dinheiro em espécie, com valor ainda não foi divulgado. Havia moedas estrangeiras, incluindo dólares americanos, dólares australianos, pesos argentinos, pesos chilenos e euros.
Na casa do vigário-geral, segundo na linha de sucesso da Diocese, foi apreendida grande quantidade de dinheiro no fundo falso de um guarda-roupa. Segundo a TV Anhanguera apurou, o montante contabilizou R$ 70 mil. A quantia estava em sacos plásticos.
Vídeo mostra quando os policias entram na casa e vão até um armário, guiados pelo vigário-geral. Eles abrem o móvel e encontram três caixas de celulares e um notebook. Um dos policiais civis começa a tirar os objetos das prateleiras enquanto o religioso diz: “Esse dinheiro é da Paróquia, não é meu não. Isso é para pagar as despesas da Paróquia”.
Padres estão detidos no presídio estadual de Formosa (Foto: DGAP/Divulgação)Padres estão detidos no presídio estadual de Formosa (Foto: DGAP/Divulgação)
Padres estão detidos no presídio estadual de Formosa (Foto: DGAP/Divulgação)

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