Depois de um ano de mandato, Lula (PT) conseguiu cumprir 20% das promessas feitas na campanha eleitoral de 2022, quando venceu Jair Bolsonaro (PL). Das 103 propostas catalogadas pela Folha de S.Paulo, há ainda 22% delas paradas, 25% em ritmo lento e 32% em andamento (a soma dos percentuais é de 99% devido ao arredondamento dos índices).
Com este número, o presidente conseguiu cumprir 1 compromisso a cada 19 dias de mandato, mais lento do que uma hipotética média ideal, de 14 dias, para completar todos os itens em quatro anos de administração.
Os dados sobre as promessas de Lula fazem parte de um levantamento realizado pela Folha de S.Paulo e foram obtidos do programa de governo do petista, das propagandas eleitorais, da carta de compromissos lançada em 27 de outubro e de entrevistas dadas à imprensa durante o pleito.
Lula lançou nessas plataformas e em declarações ao menos 103 propostas em áreas como economia, agricultura, educação, saúde e segurança pública, além de questões políticas, como a organização de ministérios. O status atual das promessas foi obtido através de informações dos órgãos do próprio governo.
Em termos absolutos, são 21 as propostas consideradas concluídas. Outras 33 estão em andamento, 26, em ritmo lento e 23, paradas. O maior número de concluídas está em economia, com 11, questões políticas, com 2, e saúde, também com 2.
As áreas com maior número absoluto de compromissos parados são segurança, com 6, economia e infraestrutura, com 3 cada uma. Meio ambiente, um dos temas em que Lula fez questão de se diferenciar de Bolsonaro na campanha, destaca-se entre as promessas em lentidão, com 6.
Procurado pela reportagem, o governo federal afirmou por meio da Secom (Secretaria de Comunicação Social da Presidência) que o primeiro ano do terceiro mandato de Lula termina com resultados importantes em diversas áreas, citando o crescimento da economia, a queda do desemprego e a retomada da imagem do país no exterior.
A Secom citou ainda melhoria na qualidade das iniciativas realizadas pelo Executivo em relação ao governo anterior e afirmou que cada ação realizada “destaca o compromisso do governo no enfrentamento das complexidades” nos setores abrangidos.
Em alguns dos temas, o petista havia feito apenas uma promessa. São os casos de tópicos relacionados a Defesa, indígenas, esporte, moradia e turismo. No caso dos povos originários, o então candidato fez apenas uma promessa, a de criar o Ministério dos Povos Indígenas, e a cumpriu.
O mesmo ocorreu com a Defesa: o único compromisso era o de inserir um civil no comando do ministério. Lula indicou José Múcio Monteiro, ex-ministro-chefe da secretaria de Relações Institucionais, e concluiu a proposta.
Já no esporte, a única proposta do mandatário está parada –ainda não foi anunciada nenhuma expansão ou aumento de investimentos no Bolsa Atleta, que remunera esportistas de alto rendimento. Apesar do crescimento no número de contemplados, o orçamento do Ministério do Esporte cairá em 2024, o que deve gerar efeitos no programa.
Na economia, foram cumpridas tanto promessas mais simples, como não privatizar os Correios e a Petrobras, quanto mais ousadas, como mudar o teto de gastos e aprovar um novo arcabouço fiscal, reajustar o salário mínimo acima da inflação e retomar o Bolsa Família a R$ 600, mais R$ 150 por filho.
Lula também cumpriu a revogação dos sigilos de cem anos editados por Bolsonaro e promoveu durante este ano maior normalidade no diálogo entre os Poderes, contrastando com o comportamento belicoso de seu antecessor. Na Saúde, retomou o Mais Médicos, com adaptações, e o programa Farmácia Popular.
Outras iniciativas de maior porte estão em andamento, como a renegociação de dívidas das famílias por meio do Desenrola Brasil, o fortalecimento do Enem e a retomada do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).
Dentre as principais promessas em ritmo lento estão a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5.000, a inclusão de câmeras corporais em todos os policiais do país e a meta de desmatamento líquido zero, além do reflorestamento de áreas degradadas.
Já algumas propostas parecem ter sido deixadas de lado pelo presidente, como o compromisso de não tentar a reeleição em 2026 –tanto Lula quanto PT deixam a oportunidade em aberto. Também não houve projetos para reorganizar o sistema penitenciário, uma reforma política prometida em plano de governo, e para mudar o sistema previdenciário.
A maioria das promessas não possui metas definidas. Na corrida eleitoral, Lula foi alvo de questionamentos por apresentar poucos números e disse que seu compromisso era a partir do legado de seus dois mandatos no Palácio do Planalto (2003-2010). Ele recebeu críticas por apresentar o que chamou-se de “cheque em branco”.
Luiz Augusto Campos, professor de ciência política no Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), considera positiva a quantidade de propostas concluídas e em andamento em meio ao ajuste da relação entre os Poderes.
Ele afirma que o período atual marca uma remodelação no comportamento de Executivo e Legislativo, especialmente após o fim do financiamento privado de campanhas, o que gera maior demanda pelos fundos públicos. Essa remodelação dificulta, então, o andamento de propostas feitas na campanha.
“Lula tem conseguido contornar com diferentes estratégias a pressão dos parlamentares por emendas, mas parece que o pacto atual do presidencialismo de coalizão vai sendo refeito a todo mês. Diante desse cenário, o governo está travado, mas surpreende que tenha conseguido avançar em várias reformas diante de tantos entraves.”
Para Campos, o próximo ano ainda está em aberto porque as eleições municipais podem melhorar a relação entre o Planalto e o Congresso Nacional, já que o petista deve ser um forte cabo eleitoral. Apesar disso, o professor afirma que o segundo ano de mandato deve ser de contingenciamento.
Para Rodrigo Gallo, cientista político e coordenador do curso de Relações Internacionais do Instituto Mauá de Tecnologia, o primeiro ano de mandato presencial costuma ser mais complexo para a concretização de promessas porque ele é cumprido com o orçamento aprovado pelo governo anterior.
Essa dificuldade, avalia Gallo, pode ser acentuada quando se muda também o espectro ideológico do novo Executivo.
“Eventualmente, uma mudança não só de governo, mas de ideologia, implica certos setores demandarem mais atenção do que outros, e o problema é que não há orçamento previsto para aplicar políticas públicas, por exemplo”, pondera.
Fonte: Folhapress
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