Antonio José Mendes Daguia |
Em Recife antes da partida |
Os
recentes conflitos envolvendo judeus e palestinos pela soberania da região
noticiado de forma generalizada em todo mundo me fez lembrar de uma bonita
história narrada por um ‘tuntuense’ há cerca de 10 anos quando ele fez parte de
uma missão internacional de paz na atual
região em conflito, a Faixa de Gaza, território ocupado pelos palestinos, mas de parcial autonomia
israelense desde o fim da Guerra dos Seis Dias, em 1967, que envolveu várias
nações opostas a criação do Estado Judeu. O protagonista da narrativa já está
radicado em Tuntum há mais de 40 anos, Antonio José Mendes Daguia, filho da cidade de Anajatuba, baixada
maranhense. Hoje pela manhã fui até sua casa ouvir por mais uma vez a história que
marcou a vida desse tuntuense por adoção.
Antes
de começar a gravar percebi apreensão na sua face já enrugada, voz um pouco
trêmula e os olhos com sinais de lacrimejamento, era a saudade do passado
distante do então jovem militar aliado ao peso dos seus 68 anos de idade.
Servir o exército não era para todos, poucos conseguiam passar pela peneira das
exigências e ser honrosamente incorporado, desejo de todo pai de família, assim
aconteceu com Daguia que foi recrutado
para o serviço em São Luis, no dia 7 de julho de 1963. No ano de 1964 a crise
se intensificava no Oriente Médio, região localizada na Ásia Ocidental composta
por 15 países. A desavença milenar entre os povos daquela região há pouco tempo
havia ganhado um novo capítulo tendo como estopim dessa vez o Canal de Suez,
eixo de navegação marítima entre o Oriente e o Ocidente atualmente sobre o
domínio egípcio. Em razão da crise a
quase recém criada Nações Unidas pediu ajuda internacional e o Brasil foi um
dos países convocado a enviar uma força de paz composta por 530 homens. Por
merecimento e disciplina Daguia foi um dos selecionados para participar da
Missão de Paz no Oriente Médio, especificamente na Faixa de Gasa, área ocupada
pelo Egito na época. Em 12 de setembro de 64 ele pisava em solo egípcio.
Daguia a direita ao centro |
-
Nós saímos de São Luís e fomos para Recife, lá passamos um mês inteiro
recebendo instruções, nós éramos 13 maranhenses, era tudo misturado, piauiense
tinha só o coronel Irapuá. Tinha oito cearenses, o restante era paraibano,
pernambucano e alagoano. Era só gente do nordeste porque o Castelo Branco
quando era presidente da república exigiu um contingente só do nordeste, porque
antes só saia do sul e sudeste, esse foi o primeiro a sair do nordeste, o 15º
contingente, narrava Daguia.
Sob
a revista do general Costa e Silva, em Recife, comandante do 4º Exercito, a
tropa embarcava para o Egito cheia de ânsia e sonhos, imaginavam que a viagem
traria bom retorno financeiro durante a estada, fato que não aconteceu. Cada
soldado recebia mensalmente somente 108 dólares livre de todas as despesas. O
governo do presidente Gamal Abdel Nasser dava 11 libras egípcia de gratificação, o
salário mínimo de lá era equivalente a 7
libras. A missão específica era a de impedir que o povo árabe saísse da Faixa
de Gaza e entrasse no território judeu. O grupamento ficava entre o fogo
cruzado dos dois países, numa fiscalização permanente de 24 horas. Cada militar
brasileiro portava um fuzil de alavanca e um binóculo de alcance, a área de
vigilância compreendia 16 quilômetros, nos postos de observação ficava um
telefone a disposição para chamar reforço caso ocorresse alguma ameaça de
invasão do espaço israelense.
Jardim das Oliveiras |
-
Durante a noite muitos tiros eram ouvidos, mas em áreas de vigilância de outras
nações. Nós não tínhamos tempo pra quase
nada, chegamos a sair algumas vezes para visitar os pontos turísticos e
fotografar. Estive no túmulo de Jesus, lavei o rosto no Rio Jordão, tomei uma
caneca de água do Poço de Jacó. Nessa época toda área ainda pertencia ao Egito.
Quando não estávamos trabalhando nós aproveitávamos o tempo livre para escrever
aos familiares, eu mandei muita carta e também recebi muita, quase não demorava
pra chegar a resposta, contou.
Jerusalém: Igreja das 12 Nações |
Em
reconhecimento pelos bons serviços prestados durante a missão de paz Daguia foi
condecorado por um antigo órgão (Unesp) da ONU recebendo uma medalha, prova de
sua eficiência durante os 11 meses de
lealdade ao povo árabe. Retornou a Pátria
Amada em 12 de agosto de 1965 para pouco tempo depois ingressar na Polícia
Militar vindo parar em terras tuntuenses por designação do coronel Godin.
- Eu estava a
duas semanas trabalhando com o coronel Godin depois de ter chegado de
Barreirinhas quando apareceu José Uruçu, ele estava acompanhado de Júlio Dantas
e o seu filho Mazim Uruçu, queriam reforço policial, conversaram comigo e me
convenceram a viajar, relatou.
Retornando ao Caíro |
Atualmente o ex expedicionário de paz está
aposentado por idade, mas ainda trabalha como motorista, função adquirida por
meio de concurso público municipal. Do
casamento com Raimunda Gonçalves Daguia tem seis filhos. Daguia não ganhou fama, muito menos dinheiro, mas
descobriu que não há limites quando a luta encabeça os sonhos para voar mais alto e descobrir novos horizontes.
Á porta do Batalhão Iuguslavo |