A Chacina dos Coelho no povoado Arroz foi o acontecimento mais marcante de nossa história local que serviu para cimentar a imagem que fazem da Mata do Japão e de nosso querido Sertão (As Areias), lugares de infeliz reputação aos olhos de conterrâneos de outras regiões do estado, principalmente, os da Capital e os do sul-maranhense (parte mais antiga em sua formação), como assinala o Profº Fonseca Neto, em sua obra de fôlego, intitulada – História das Passagens, em que trata da formação histórica de toda a região do antigo Pastos Bons:“Deve-se consignar que, por muito tempo, as populações dos sertões maranhenses de colonização mais antiga, viam a região dos hoje municípios de São Domingos, Presidente Dutra, Tuntum, Dom Pedro e adjacências, como a “Mata do Japão”, significando um lugar de difícil acessibilidade, fixação cultural pífia, amoldamento social frouxo, lugar de forasteiros etc.”. A caracterização “de difícil acessibilidade” é pertinente, devido à mata densa existente à época do início do povoamento que talvez justifique o “amoldamento social frouxo”, nessa perspectiva sim. Quanto ao conceito de cultura em “fixação cultural pífia”, nos leva a indagar: Qual o conceito de cultura das “populações dos sertões maranhenses de colonização mais antiga”? Entretanto, o discurso produzido sobre determinados fatos serviram ou servem para justificar tal (pre)conceito, entre os quais destacamos o fatídico caso dos Coelhos de 1958. Os Coelho, tradicional família do sul do Maranhão (Pastos Bons, Riachão, Carolina, etc.), foi bastante perseguida por estabelecer vínculo de amizade com Leão Leda, no evento que ficou conhecido como A Guerra do Leda*, sendo o clã obrigado a sair em retirada em busca de paz e tranqüilidade. Parte dela chegou a Tuntum ainda em 1910, capitaniada por Luís Coelho. Seus filhos logo que aqui chegaram começaram a se destacar. A indústria, o comércio e pecuária foram os setores de sua especialidade, tendo como expoentes - o Sr. Frederico Coelho, dono da primeira máquina de beneficiar algodão; Alípio, comerciante, que também exercer cargo de vereador quando Tuntum ainda pertencia a Presidente Dutra (1951-1955), e; José, fazendeiro, cuja propriedade estava situada no povoado Arroz, onde também residia. Este último dono de honrosa reputação teve com sua esposa Izidra vários filhos, dentre os quais uma bela jovem de nome Maria, que atendia pela alcunha Maruzinha. Esta adorável de boa estirpe se enamorou por um “forasteiro” conhecido por João Bastos, cuja reputação lhe garantiu a reprovação da família da moça. Inconformado com a rejeição João raptou Maruzinha e obrigou o Juiz de Paz de Tuntum a casá-los. Consumado o matrimônio, registra a literatura oral que o esposo inicialmente, demonstrava muito afeto para com a amada. Porém, após algum tempo João teve que fazer uma viajem para o Sertão, pois um de seus irmãos havia sido assassinado e que competia-lhe a missão vingá-lo. Em sua ausência Maruzinha começou a freqüentar festas, fincando mal reputada ante a sociedade, o que chegou ao conhecimento de João Bastos. Depois de algum tempo Maruzinha, temendo o pior, pois conhecia bem a índole de seu esposo, resolveu ir ao encontro do marido. A partir de então, se iniciaria uma triste e dolosa convivência, visto que João sentia-se magoado e desonrado em função dos boatos acerca da conduta de sua mulher. Passado algum tempo, Maruzinha que fora submetida à duras penas, resolveu deixar João e retornar para o seio de sua família. Entãos partiu às escondidas, com medo de represália, entretanto, cometeu talvez o pior de todos os seus erros: furtou as armas do marido e as levou consigo. Embriagado de ira com a ação de Maruzinha, João Bastos começou a arquitetar um plano de vingança contra ex-mulher e sua família. Assim, convocou o seu irmão Dom Ratinho e o velho Pedro Feiticeiro, companheiros de outras empreitadas sinistras. Traçado o roteiro da “expedição”, João Bastos ainda ousou em enviar comunicados de sua “visita” à família Coelho. Não acreditando, nessa possibilidade os Coelhos de nada fizeram para se protegerem. No limiar da noite de 18 de julho de 1958, os homicidas invadiram a residência de José Coelho e o assassinaram, juntamente com um de seus filhos e também Maruzinha, a qual o próprio João Bastos se encarregou de lhe imputar os mais agonizantes e brutais suplícios e consumido pelo ódio se mostrou insensível aos apelos de sua musa de outrora. A sogra fora poupada, para que criasse o pequeno filho, que o próprio João Bastos arremessou pela janela, este vive na cidade de Imperatriz e é deficiente físico devido à ação do pai. João Coelho, irmão de Maruzinha, conseguiu fugir, mas além das perdas de seus familiares, teve que adiar o seu casamento em mais de um ano, festa que estava marcada para o dia seguinte. Uma noite de terror! Sua repercussão aterrorizou e comoveu todo Maranhão. Em Tuntum, enquanto uns choravam o ocorrido, outros se mobilizavam para lavar a honra dos respeitáveis e valorosos Coelhos. Homens foram arregimentados, aproximadamente cem. E assim começou uma implacável caçada aos facínoras. Trama digna de produção cinematográfica, vários foram os embates com os bandidos. Na Mucunã, próximo a São José dos Basílios, o Pedro Feiticeiro foi preso e conduzido amarrado à Cadeia de Tuntum, sendo executado em poucos dias por parentes das vítimas. João Bastos e Dom Ratinho fugiram para a região do Mearim, passando pelo Olho d’água do Tolentino, Centro dos Doidos, Pilões, Marianópoles, Santa Vitória, onde moravam seu pais. Foram cercados em Barro Branco, município de Barra do Corda, onde sucumbiu Dom Ratinho e que João Bastos ficou bastante ferido, porém, ainda assim, bateu em retirada para o Sertão tuntuense, porém no povoado São Joaquim dos Melos foi aprisionado, terminando aí a caçada. Após receber muitos tiros chegaria ao fim à trajetória de um personagem controverso de nossa história local, pois há que defenda que João Bastos depois de tanto se esquivar dos cercos merecia escapar ao final com vida. O mesmo é sepultado no lugarejo Corrente, a uns três quilômetros de São Joaquim dos Melos. Evidentemente, o relato acima se trata de uma síntese, pois não temos a intenção de sermos detalhistas, até por que isso requer um maior rigor, uma investigação mais criteriosa. Entretanto, o nosso objetivo é demonstrar que a representação de um fato pode servir de argumento para justificar os (pré) conceitos e os juízos de valor. De modo algum, quero advogar que nosso lugar é menos violento do que outros, ou que não ocorrem fatos abomináveis, mesmo por que não podemos omitir as execuções sumárias em logradouros públicos de nossa cidade nos últimos anos, o que inclusive mobilizou a população, em prol de uma segurança pública eficiente, resultado num maior efetivo policial, mas sem a eficácia esperada. Por outro lado, cabe aqui afirmar que tal aspecto não é exclusividade nossa. A violência é inerente à natureza humana e mostra a sua pior face onde não há educação de qualidade, enfim, inoperância do Estado.
Por Gean Carlos