(*) Mhario Lincoln

Nas palavras do Papa Bento XVI: “(...) o celibato é uma antecipação do céu.” (...)”.
O
mundo acordou hoje chocado com a pré-renúncia do Papa Bento XVI, cujo
último dia de papado será 28 de fevereiro, até às 20 horas. Em seu lugar
assume (pro tempore) um auxiliar direto do Vaticano chamado de Carmelengo. E quem é?
O
Carmelengo da Igreja Católica é o administrador da propriedade e
receita da Santa Sé; suas responsabilidades incluem a administração
fiscal do Patrimônio de São Pedro e a administração da Igreja Católica
na morte ou renúncia do Papa, até a eleição do substituto, fato que pode
durar por um mês.
Já
a renúncia de um Papa está prevista no Código de Direito Canônico: "Se o
Romano pontífice renunciar a seu ofício, requer-se para a validade que a
renúncia seja livre e se manifeste formalmente, mas que não seja aceita
por ninguém", estabelece o cânone 332,2 do Código de Direito Canônico,
único elemento válido para julgar o tema.
Porém,
pelo que foi divulgado, inclusive pela nota oficial de Bento XVI, a
questão saúde física foi a gota d’água para a renúncia. Há, porém,
dúvidas com relação especificamente a essa questão. “Não é doença, mas
cansaço físico”, dizem vaticanólogos.
A
questão da saúde física do Papa, sem dúvida, se manifesta em pontos
controversos onde ele não conseguiu mais forças para sustentar com vigor
suas considerações diante de quatro temas que insistem ser as pedras no
sapato do Vaticano e, principalmente, de sua administração:
1 – A questão do Casamento Gay;
2 – A questão das Células-Tronco;
3 – As denúncias de Pedofilia na Igreja; e
4 – O Casamento de Padres.
Esses, sim, são os pontos fundamentais que podem ter apressado a renúncia do Papa Paulo XVI. Se não, vejamos.
O
Cargo de Papa é tão importante para a humanidade católica (e para
alguns não católicos também) que nunca na história da Igreja um
pontífice renuncia ao cargo com essa idade de 85 anos. (Faz 86 em
abril/13).
Para
se ter uma ideia, até Bento XVI anunciar sua renúncia, a última vez que
um Papa abdicou do cargo foi há quase 600 anos. Em 1415, o Papa
Gregório XII quis sair do cargo para encerrar uma disputa com um
candidato rival à Santa Sé.
Desta vez, forças ocultas – como diria Jânio Quadros – também influenciaram em sua saída. Não poderia ser diferente.
A
questão da pedofilia na Igreja Católica, por exemplo, chegou a
envolver, inclusive, um irmão dele, padre Georg Ratzinger, que dirigiu
de 1964 a 1994 o famoso coral da catedral de Regensburgo, também
conhecida por catedral de Ratisbona.
Esse
escândalo com meninos desse Coral veio a público em março de 2010 e se
refere aos consumados crimes de pedofilia e atentado ao pudor que
vitimaram os meninos-cantores. Esses crimes sexuais de autoria de padres
ocorreram entre 1958 a 1973. Portanto, ainda na gestão de Georg
Ratzinger.
Todavia, no apurado geral, pesou sobre ele (Georg), apenas, acusação de omissão pertinente aos crimes.
Outra
questão forte, cujo intenso conservadorismo acabou afastando as
correntes mais modernas do Vaticano, se refere ao dogma evolutivo.
Prendeu-se à discussão das Células-Tronco, atualmente uma realidade no
mundo científico.
A
Igreja, através de Bento XVI, condenou fortemente tanto a clonagem e
pesquisa com célula-tronco embrionária, como anticoncepcionais e
fertilização artificial, considerados “imorais”, posição dura e
conservadora divulgada em documento sobre bioética, assinado também pelo
corpo doutrinal do Vaticano.
Por
outro lado, Bento XVI nunca foi tão conservador quanto a sua oposição
irremediável na questão do Casamento Gay. Uma das mais fortes
manifestações contrárias a isso se deu em novembro do ano passado
(2012).
Mesmo
defendendo a homossexualidade, a Igreja Católica de Bento XVI condenou
drasticamente o que chamou de “atos homossexuais”, isto é, as uniões
gays, as quais “não devem ter o mesmo valor das heterossexuais e não
devem permitir que crianças sejam adotadas”.
E
por último pesou nessa decisão da renúncia de Bento XVI a questão do
casamento dos padres. Na maioria das outras religiões que aumentam seus
fiéis a cada dia, seus líderes, pastores, ou equivalentes, têm o direito
a constituir família.
Isso
mostra que o Celibato da Igreja Católica é realmente uma pesada pedra
no sapado de quem comanda o Vaticano, principalmente porque aqueles mais
inteligentes e mais conscientes de sua Fé costumam abandonar a Igreja
para constituírem famílias.
Existem
muitos exemplos no Mundo de padres, freiras (ou religiosos católicos),
que abdicaram de seus compromissos com a Igreja ( e de "antecipar-se ao
Céu" ), para formar uma família.
Tão
radical é o pensamento de Bento XVI com relação ao Celibato que, ao
responder a um questionamento público, certa vez, disse: “O sentido
profundo do celibato em um sacerdote é que antecipa a vida plena da
ressurreição”, ou seja, quem não constitui família vai mais rápido para o
Céu. Nas palavras do Papa: “(...) o celibato é uma antecipação do
céu.” (...)”.
Sem
dúvida, não só a idade, mas a política interna do Vaticano com Cardeais
e Padres influentes dispostos a se reorganizarem diante da evolução do
Mundo, devem ter pressionado a atual administração na mudança de rumos
da Igreja que perde, a cada ano, mais fieis para outras religiões,
especialmente para a Evangélica.
Observe:
só no Brasil, em 30 anos, o percentual de evangélicos passou de 6,6%
para 22,2% da população, sendo o segmento religioso que mais cresceu. Os
evangélicos chegaram assim a 42,3 milhões no ano de 2010, um aumento de
16 milhões de pessoas desde 2000, quando foi realizado o último Censo.
Essa
mesma pesquisa, entretanto, aponta que a população católica diminuiu
muito, passando de 73,6% em 2000 para 64,6% em 2010. A igreja católica
vem mostrando queda desde o primeiro Censo, realizado em 1872.
Pelo
visto, os católicos influentes do Vaticano não querem mais esse
rigorismo tradicionalista à la Bento XVI e podem ter influenciado, sim,
na decisão do Papa em renunciar “para deixar que outros católicos mais
modernos decidam os destinos dos Católicos”.
Mesmo
que com elegância, inteligência e dedicação, Bento XVI desde que
assumiu o Vaticano há 8 anos, nunca conseguiu, efetivamente, marcar seu
pontificado, fato que seu antecessor João Paulo II, nos mais de 20 anos
de papado, fez. E esse, além dos itens citados no começo deste texto,
foi também um de seus grandes desafios, infelizmente, não superado.
Abaixo a Carta de Renúncia:
“Caríssimos Irmãos,
Convoquei
vos para este Consistório não só por causa das três canonizações, mas
também para vos comunicar uma decisão de grande importância para a vida
da Igreja. Depois de ter examinado repetidamente a minha consciência
diante de Deus, cheguei à certeza de que as minhas forças, devido à
idade avançada, já não são idôneas para exercer adequadamente o
ministério petrino.
Estou
bem consciente de que este ministério, pela sua essência espiritual,
deve ser cumprido não só com as obras e com as palavras, mas também e
igualmente sofrendo e rezando. Todavia, no mundo de hoje, sujeito a
rápidas mudanças e agitado por questões de grande relevância para a vida
da fé, para governar a barca de São Pedro e anunciar o Evangelho, é
necessário também o vigor quer do corpo quer do espírito; vigor este,
que, nos últimos meses, foi diminuindo de tal modo em mim que tenho de
reconhecer a minha incapacidade para administrar bem o ministério que me
foi confiado.
Por
isso, bem consciente da gravidade deste ato, com plena liberdade,
declaro que renuncio ao ministério de Bispo de Roma, Sucessor de São
Pedro, que me foi confiado pela mão dos Cardeais em 19 de Abril de 2005,
pelo que, a partir de 28 de Fevereiro de 2013, às 20,00 horas, a sede
de Roma, a sede de São Pedro, ficará vacante e deverá ser convocado, por
aqueles a quem tal compete, o Conclave para a eleição do novo Sumo
Pontífice.
Caríssimos
Irmãos, verdadeiramente de coração vos agradeço por todo o amor e a
fadiga com que carregastes comigo o peso do meu ministério, e peço
perdão por todos os meus defeitos. Agora confiemos a Santa Igreja à
solicitude do seu Pastor Supremo, Nosso Senhor Jesus Cristo, e peçamos a
Maria, sua Mãe Santíssima, que assista, com a sua bondade materna, os
Padres Cardeais na eleição do novo Sumo Pontífice. Pelo que me diz
respeito, nomeadamente no futuro, quero servir de todo o coração, com uma vida consagrada à oração, a Santa Igreja de Deus.”