por johncutrim

DE VOLTA PARA O FUTURO Comunista repete Pedro Malan, ex-ministro da Fazenda de FHC: “No Brasil até o passado é imprevisível”
ISTOÉ
– Não bastasse o rombo nas contas públicas deixado pela antecessora, o
governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), deparou-se com mais um
grave e surpreendente problema administrativo, ao encerrar seu primeiro
mês de mandato: a ex-governadora Roseana Sarney não quitava as despesas
com energia dos órgãos públicos havia meses e o Estado deve R$ 30
milhões à companhia elétrica. A pendência se soma à dívida de R$ 1,1
bilhão herdada do governo anterior que, aos poucos, será equacionada,
segundo afirmou Dino em entrevista à ISTOÉ. “É impossível que a gente
corrija em 30 dias tudo de errado que fizeram em 50 anos. De qualquer
forma, acabamos com o nepotismo e não há ninguém no governo ocupado em
assaltar o erário público”, salientou o novo governador.

“O
que for estritamente pessoal na Fundação Sarney não interessa para a
manutenção com dinheiro público. Ele pode fazer um memorial privado”
Sobre o cancelamento da obra da Refinaria
Premium I, muito criticada pela oposição, Dino atribuiu a culpa ao
ex-ministro de Minas e Energia Edison Lobão e ao seu padrinho José
Sarney e lembrou da relação deste com Paulo Roberto Costa, ex-diretor da
Petrobras, partícipe e delator do esquema de desvios na estatal. “Sabe
Deus o que está enterrado nesse buraco da refinaria, boa coisa não é. O
intermediário dos negócios com o governo do Maranhão era o notório e
notável Paulo Roberto Costa. Era ele que vinha aqui. Em todas as fotos
da refinaria, com Roseana, com Sarney, com Lobão, está o Paulo Roberto
Costa.”

“O intermediário dos negócios com o governo do Maranhão era o notório e notável Paulo Roberto Costa. Era ele que vinha aqui”
ISTO É -Um mês de governo foi tempo suficiente para o sr. conhecer a real situação do Estado?
FLÁVIO DINO – Há uma frase atribuída ao ex-ministro Pedro Malan que
se aplica à realidade em que a gente se encontra: no Brasil até o
passado é imprevisível. Toda semana é uma surpresa. Na terça-feira nós
descobrimos que a conta de energia elétrica dos órgãos públicos não
estava sendo paga havia vários meses, uma dívida de R$ 30 milhões. Não
houve uma transição organizada: no meio do processo a governadora
Roseana Sarney renunciou. Então, o que nós apuramos até aqui são débitos
da ordem de R$ 1,1 bilhão. Nós fizemos uma economia rigorosa de
custeio, seguramos a abertura do Orçamento e estamos lutando para
atualizar esses débitos passados, sobretudo com os servidores e
prestadores de serviço. As dívidas inadiáveis, como o empréstimo que
Roseana havia feito com o Bank of America, uma parcela de R$ 110
milhões, nós pagamos neste mês.
ISTOÉ – Antes de assumir, o sr. impediu sua antecessora de
fechar um contrato bilionário de terceirizados para os presídios. Qual
foi a alternativa para lidar com a falta de funcionários?
FLÁVIO DINO – Vamos substituir os terceirizados por trabalhadores
temporários. Mesmo pagando um salário maior, o Estado terá uma economia
anual de R$ 20 milhões. Isso mostra que a terceirização é ineficiente. O
passo seguinte é fazer o concurso ainda neste ano para preenchimento
dos cargos de agente penitenciário. Esse é o primeiro desafio; o segundo
é ampliar e melhorar os presídios. Encontramos as obras de unidades
prisionais paralisadas, porque elas haviam sido contratadas com base em
situações de emergência que foram decretadas no auge da crise. O
presídio Timon era para ter sido concluído em outubro; o de Imperatriz,
em setembro. As obras não foram concluídas. Um caminho jurídico para dar
sequência às obras é a assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta
(TAC).
ISTOÉ – Por que os órgãos de controle do Estado não
detectaram as irregularidades nas contas públicas durante o mandato de
Roseana Sarney?
FLÁVIO DINO – Os mecanismos de controle interno, externo e as ações
do Ministério Público sempre foram muito frágeis, de baixa eficácia.
Estamos tentando redesenhar esses mecanismos. O governo procurou o
Tribunal de Contas do Estado para fazer o treinamento dos novos
servidores. Estamos apurando e encontrando absurdos. Vamos provocar o
tribunal de contas, o Ministério Público. Vamos enviar tudo para que
eles tomem as providências que considerarem necessárias. Há casos de
total afronta à lei de responsabilidade fiscal.
ISTOÉ – O sr. recebeu críticas pela composição do secretariado. Existem parentes e apadrinhados em seu governo?
FLÁVIO DINO – Não há nenhum parente meu em nenhum cargo até o 20º
grau, rigorosamente nenhum. Em relação aos secretários, o que aconteceu é
que nós estamos formando equipes. As pessoas citadas como aliados são
servidores de carreira de vários órgãos. O caso em que mais bateram foi o
da chefe de gabinete do governador. Ela é dirigente do PCdoB há 20
anos, foi dirigente do sindicato e coordenou minhas campanhas desde
2006. É professora concursada. Ela atualmente tem relação afetiva com
outro secretário. É a mesma situação da ministra Gleisi Hoffmann com o
ministro Paulo Bernardo. Eu não posso punir o amor, não posso controlar a
vida afetiva das pessoas. Ele a nomeou? Não, fui eu quem nomeou. Não há
nenhuma violação legal. Há uma tentativa dos nossos antecessores de
buscar nos igualar a eles. Eles dizem o tempo todo: nada mudou. Mas o
povo está vendo, não há nepotismo no Maranhão, não há ninguém no governo
ocupado em assaltar o erário público, essa é uma grande mudança.
Acabamos com as quadrilhas que operavam no governo do Maranhão. Nós
pegamos o portal da transparência com 40% de gastos secretos e estamos
refazendo o sistema. Eles estão nos acusando de deixar o portal fora do
ar durante a troca da metodologia. Mas nós estamos corrigindo uma
fraude. Eles cobram, mas é impossível que a gente corrija em 30 dias
tudo de errado que fizeram em 50 anos.
ISTOÉ – O cancelamento das obras da Refinaria Premium I trará prejuízos ao Maranhão?
FLÁVIO DINO – A refinaria é uma boa ideia mal executada. Que o Brasil
precisa de mais refinarias não há dúvida. Que é justo e necessário que
essas refinarias sejam construídas nas regiões Norte e Nordeste é
indiscutível. O principal produto do complexo portuário é combustível. O
Maranhão é um grande distribuidor de combustível para o Norte e o
Nordeste, é um entreposto. Temos necessidade de refino, porto, ferrovias
e rodovias. A própria localização geográfica do Maranhão é estratégica,
pois está no meio do caminho, tem acesso direto ao Centro-Oeste via
ferrovias. São muitas vantagens técnicas.
ISTOÉ – Então, por que o projeto fracassou?
FLÁVIO DINO – O problema foi a apropriação eleitoreira, a agonia do
Edison Lobão e do José Sarney quando eram ministro de Minas e Energia e
presidente do Senado. Forçaram a mão para que o projeto da refinaria
saísse de qualquer jeito, sem projeto, sem estudo técnico. Deu no que
deu. Agora eles estão querendo empurrar o problema para mim. Eu tenho
que salvar a refinaria do Maranhão. Eles me cobram todo dia. O Sarney
fez um artigo dizendo que o governo tem que se mobilizar. Claro que eu
desejo que o Maranhão receba uma refinaria, mas quem criou o problema
foram eles. Que resolvam. O certo é que enterraram R$ 1,5 bilhão aqui e
ninguém sabe como e por que agora há um vazio completo. Estou esperando
passar a situação de instabilidade institucional muito aguda da
Petrobras, que acabou resultando nesse anúncio da saída da Graça Foster.
Estou esperando as coisas se arrumarem para eu restabelecer um diálogo
com a Petrobras, em outras bases, em outros termos, dessa vez como uma
coisa séria. Não por acaso, o intermediário dos negócios com o governo
do Maranhão era o notório e notável Paulo Roberto Costa. Era ele que
vinha aqui. Em todas as fotos da refinaria, com Roseana, com Sarney, com
Lobão, está o Paulo Roberto Costa. Era ele o interlocutor, ele que
vinha, ele que reunia, ele que anunciava. Sabe Deus o que está enterrado
nesse buraco da refinaria. Boa coisa não é.
ISTOÉ – O ex-presidente José Sarney atribuiu os cortes de
verbas na fundação que guarda seu acervo a uma vingança. A instituição
será fechada?
FLÁVIO DINO – O que a gente fez emergencialmente foi reduzir os
gastos. Havia um comprometimento com pessoal lá que ultrapassava R$ 2
milhões. Reduzimos a folha. Agora estamos averiguando a parte estrutural
do prédio. O Convento das Mercês está com risco de desabamento, várias
partes estão escoradas. Não consigo entender como deixaram um prédio do
século XVII naquela situação. Estamos rediscutindo o modelo da fundação.
O que se referir ao mandato presidencial do senador José Sarney pode
integrar o acervo da fundação. O que for estritamente pessoal não
interessa para a manutenção com dinheiro público. Ele pode fazer um
memorial privado, custeado com dinheiro privado.
ISTOÉ – Qual é o futuro da Fundação Sarney?
FLÁVIO DINO – Nossa proposta é que fiquemos responsáveis apenas pela
guarda do que é estritamente relacionado ao período presidencial. O
passo seguinte é transformá-la em uma fundação de memória republicana, e
não no registro de passagem de um único político.
ISTOÉ – No Congresso, o sr. ajudava nas articulações do
governo. Como analisa a eleição de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) para a
presidência da Câmara?
FLÁVIO DINO – Menos problemas do que se prevê. O governo continua a
ter uma maioria folgada. A grande questão é a gestão dessa maioria. Há
alguns anos, o PT tinha uma visão de que a chave da governabilidade é um
duopólio PT/PMDB. Essa foi a estratégia do segundo mandato do Lula e do
primeiro mandato da Dilma. Os conflitos e dificuldades iniciais mostram
que é hora de uma visão mais aberta.
ISTOÉ – Com os desdobramentos do escândalo da Petrobras,
crises hídrica e energética e um inimigo no comando da Câmara, o governo
corre o risco de atravessar uma crise institucional?
FLÁVIO DINO – Crise institucional, não. Passamos por muita coisa na
superação da ditadura para a democracia. Está muito claro que não há um
cenário de impasse sem saída. A tendência é haver algum tipo de
rearranjo, pacto entre as forças políticas. A iniciativa de abrir um
diálogo com a oposição tem que partir do governo. A continuidade do
clima do segundo turno não ajuda para que os problemas da população
sejam resolvidos. Essa polarização sectarizada entre PT e PSDB não ajuda
o Brasil. Essa é uma briga paulista que acabou se tornando uma questão
nacional de um modo, a meu ver, muito artificial