As guardas municipais desempenham atividade de segurança pública com o poder/dever de proteger os bens, serviços e instalações municipais, bem como seus respectivos usuários. No entanto, não estão autorizadas a atuar como verdadeira Polícia, para reprimir e investigar a criminalidade urbana ordinária. Assim decidiu a 3ª seção do STJ.
Os ministros decidiram fixar o alcance da atuação das guardas municipais, frente ao reconhecimento recente do STF (ADPF 995) de que a guarda municipal integra o sistema de segurança pública. O colegiado considerou que, inegavelmente as guardas municipais integram o sistema de segurança pública, mas tem sua atuação limitada ao que à proteção de bens, serviços e instalações do município.
Ainda, segundo o entendimento da 3ª seção, apenas em situações absolutamente excepcionais a guarda pode realizar a abordagem de pessoas e a busca pessoal, quando a ação se mostrar diretamente relacionada à finalidade da corporação.
Segundo o relator, tanto a Polícia Militar quanto a Polícia Civil, em contrapartida à possibilidade de exercerem a força pública e o monopólio estatal da violência, estão sujeitas a um rígido controle correcional externo do MP e do Poder Judiciário (Justiça militar e estadual), o que não acontece com as guardas municipais.
Para Schietti, fossem as guardas municipais verdadeiras polícias, por certo também deveriam estar sujeitas ao controle externo do MP e do Poder Judiciário em correições periódicas.
“Não é preciso ser dotado de grandes criatividades para imaginar, em um país, com suas conhecidas mazelas estruturais e culturais, entre as quais o racismo, o potencial caótico de autorizar que cada um de seus 5.570 municípios tenha sua própria Polícia subordinada apenas ao prefeito local e insubmissa a qualquer controle correcional externo.”
Schietti ressaltou que, se mesmo no modelo de policiamento, sujeita a controle externo do MP, e concentrado em apenas 26 Estados e o DF, já se encontram “dificuldades de contenção e responsabilização por eventuais abusos na atividade policial como o cotidiano mostra, é fácil identificar o exponencial aumento de riscos e obstáculos à fiscalização caso se permita a organização de polícias locais (municipais) nos 5.570 municípios brasileiros”.
De acordo com Schietti, o fato de as guardas municipais não haverem sido incluídas nos incisos do art. 144, caput, da CF, não afasta a constatação de que elas exercem, sim, atividade de segurança pública, e é isso que disse o Supremo. “Isso não significa, porém, que possam ter a mesma amplitude de atuação das polícias”, destacou.
“O STF, apesar de reconhecer em diversos julgados que as guardas municipais integram o sistema de segurança publica e exercem atividade dessa natureza, nunca as equiparou por completo aos órgãos policiais para todos os fins. A 1ª turma do STF também asseverou que as guardas municipais não estão autorizadas a, ultrapassando os limites próprios de uma prisão em flagrante, realizar diligências investigativas ou prévias voltadas a apuração de crimes.”
Em 25 de agosto, o STF julgou procedente a ADPF 995 declarando inconstitucionais todas as interpretações judiciais que excluem as guardas municipais devidamente criadas e instituídas como integrantes do sistema de segurança públicas. Segundo Schietti, a Corte Suprema reafirmou que as guardas municipais integram o sistema de segurança públicas, mas não lhes conferiu poderes idênticos aos dos órgãos policiais.
Na definição do ministro, trata-se de agentes públicos que desempenham atividade de segurança pública e são dotados do importante poder/dever de proteger os bens, serviços e instalações municipais, bem como seus respectivos usuários.
É possível e recomendável, dessa forma, que exerçam a vigilância de creches, escolas, postos de saúde municipais, para garantir que não tenham sua estrutura danificada por vândalos, ou que seus frequentadores que não sejam vítimas de furto, roubo, tráfico ou violência, a fim de permitir, portanto, a continuidade da prestação do serviço público municipal com relato a tais instalações.”
Ainda, o ministro salientou que guardas municipais podem realizar patrulhamento preventivo na cidade, mas sempre vinculados à finalidade de tutelar bens, serviços e instalações municipais e, por decorrência, os seus respectivos usuários, sem que lhe seja autorizado atuar como verdadeira Polícia para reprimir e investigar a criminalidade urbana ordinária, tal como ocorre na maioria das vezes com crime de tráfico de drogas.
“Não é das guardas municipais, mas sim das Polícias, como regra, a competência para investigar, abordar e revistar indivíduo suspeito da prática de tráfico de drogas ou de outros delitos cuja prática não atinja de maneira clara, direta e imediata os bens, serviços e instalações municipais ou as pessoas que os estejam usando naquele momento.”
Salvo na hipótese de flagrante delito, só é possível que as guardas municipais realize excepcionalmente busca pessoas se além da justa causa para a medida (fundada suspeita), houver relação clara, direta e imediata com a necessidade de proteger a integridade de bens, serviços e instalações municipais ou assegurar a adequada execução de serviços municipais, assim como resguardar a integridade de seus respectivos usuários. O que não se confunde com a permissão para desempenhar atividades ostensivas ou investigativas típicas das polícias militar e civil para combate da criminalidade urbana ordinária em qualquer contexto.”
Assim, concedeu a ordem para declarar ilícitas as provas colhidas pela busca pessoal, bem como a ilicitude de todas as provas dela decorrentes, e por consequência absolver o réu.
A decisão foi unânime. Os ministros Reynaldo Soares da Fonseca, Joel Ilan Paciornik, Messod Azulay Neto, acompanharam com ressalva de que vão esperar a publicação do acórdão do STF.
- Processo: HC 830.530
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